quinta-feira, 17 de março de 2011

Que droga de beijo

Chega e buzina.
"Já vou abrir!"
Apanho a chave que nunca encontro, e no portão, ele faz a mesma pergunta de sempre, repete a mesma frase de sempre. Boca-na-boca ridiculamente chamada de beijo. Às vezes um cheiro bom de perfume faz crescer as expectativas da noite que logo morrem quando ele olha para mim com mesmo olhar.
Eu, salto, vestido provocante, a maquiagem que combina com o tom da pele e da lua.
"Oi".
E fico esperando um algo assim mais aconchegante que não vem, então passo a não esperar mais nada. Mas que droga de noite. "Oi?" Mas que droga de "oi", mas que droga de "beijo", mas que droga de adornos que mais parecem o figurino de uma cena que deveria ser feliz.
"Você está quieto".
"Você está quieta".
E o silêncio torna-se motivo de uma agravante briga repetitiva que começou no portão. No portão? Na porta do coração. Naquilo que deveria ser semeado e não foi.
Erramos.
"Para onde vamos?"
"Para onde você quiser."
"Eu quero um lugar diferente"
E lá vamos nós para o mesmo lugar porque a minha palavra não vence, e ele rindo de mim dizendo que eu não aguento badalar.
A conversa flui algumas vezes agradável. Outras vezes eu apenas o ouço com raiva de algumas palavras que fico repetindo e engolindo dentro da minha cabeça. Tento ser agradável e de repente falar de mim? Melhor calar, porque pra ele só tenho erros. Então me calo.
E a noite vai terminando do mesmo jeito que sempre termina.
Por vezes com uma conversa dolorida "eu não sei mais o que faço porque você não era assim". Então eu choro, porque eu não era assim e não sei o que me fez tão diferente.
Ele deixa que eu chore um choro dolorido e espantoso por um tempo que parece eterno. E o choro é apenas o pedido do abraço depois do portão aberto.
O consolo é a cobrança do "mude por favor, seja o que era". E o choro continua no travesseiro porque o que era já foi, já não pode ser. Nem ele é, mas insiste em dizer "eu não mudei".

Um comentário:

  1. As vezes a gente só quer congelar as coisas, sem que elas esfriem, no entanto.

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