terça-feira, 31 de maio de 2011

Sintonia

Não vivo muitos momentos solenes, ainda mais um celebrado num quase silêncio em meio a angústia fina de um duro final de dia. Na cama, acompanhada daquela tristeza que dá nó e sufocando um choro no travesseiro desejei alguém. Fiz minha prece, mas não pensei em seres celestiais, queria alguém de carne e osso. Lembranças de companhias vinham, e bem a dele que enchia o quarto e preenchia o coração. Talvez pra dar nome a dor, pra chamar aquilo de saudade, ou talvez porque eu simplesmente o ame e o queira por perto. Então, como de costume, enxuguei as lágrimas, acendi a lâmpada e apanhei o caderninho e a caneta da cabeceira da cama. Escrevi exatamente estas palavras:

Tente arrumar algum tempo pra mim, e como deve ser difícil. E sei que você sabe que eu disse algum, e não todo tempo. Mas paixões comprometem e você está certo em comprometer-se. Entretanto queria tanto alguém para dividir meu lado bom, porque não tenho coragem de lhe expor o meu terror. E sinto sua falta. E ao mesmo tempo quero que você voe, meu bem. Mas vem de vez em quando compartilhar seu infinito.

Apaguei a luz e deitei novamente, com os olhos mais calmos e a mente menos marejada. Foi quando a porta abriu com um:
Acordada? Posso entrar?
Entre querido, e pode acender a luz...
Ele apenas entrou, deitou do meu lado e segurou a minha mão. Alguns segundos quietos e depois despejo de palavras leves que aliviam corações pesados (de ambos) e ele dormiu ali, ao meu lado. E eu emocionada e assustada por uma realização quase banal e tão rara. Mas, não sozinha. Nunca sozinha, ele sabe. Eu é que insisto na dúvida.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Estúpido apaixonado

Conheci um estúpido que se diz apaixonado. Pode ser que realmente esteja porque a paixão em si, muitas vezes, aparece como idiotia crônica. Há quem diga que é necessário ser um pouco estúpido, ter certa falta de inteligência, uma certa falta de juízo. Mas este é totalmente estúpido, e não sei como consegue reunir tantos sinônimos desprazeirosos. Possui uma absoluta falta da habilidade social do lidar com o próximo, e ao mesmo tempo é desprovido do cuidado de não sair da razão para não ser incortez, descivilizado, grosseiro e bruto - inclusive com o objeto amado.  E é engraçado observar suas tentativas insólitas e grotescas de conquista. Não é possível ao menos considerá-lo ingênuo, brincalhão ou distraído quando por vezes machuca a pele, a carne e o coração de quem passa pelo seu caminho, porque ele é simplesmente como eu diria, um estúpido com maestria. Por isso, embora sua expressão corporal consiga alcançar certa teatralidade amorosa, parece que não ama. Insiste na conquista utilizando-se de toda sua refinada impolidez, abordando com uma impressionante descortezia - que dirá o resto - com sua alma ausente de hurbanidade e civilidade, não sei se por dedicação ou traço genético ou desvio de personalidade. Mas, talvez ame, por que não? É apenas estúpido e deve haver quem goste de uma indelizadeza, de um despropósito e de uma mágoa (porque haja coração). Quanto a mim, estupidez me desapaixona, já basta a imperfeita natureza humana. Esse acúmulo de qualidades não me cabem na traqueia.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Nada sutil

Na verdade minha casa, meu quarto, meu coração são meus, de ninguém mais. Eu fingi que doei, que aluguei, que me dei sem fingir. Eu quero ser invadida. Vai, arromba essa porta. Estou esperando há muito que você entre e me roube sorrateiramente. Toda a violência é permitida, não me deixe aqui fechada esperando mais uma gentileza. Não me deixe aqui fechada, mas não bata na porta, não peça licença, não pergunte se pode. Me arranque, me agarre, me beije. Eu sei que haverá paixão e é essa paixão que eu quero. ignore meu rosto de espanto, meu corpo acuado e a tentativa de fuga se houver. Esqueça minha primeira reação e simplesmente habite em mim

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Pare de magoar

Para que magoar tanto e tanta gente ao mesmo tempo? Eu amo você por todas as lembranças mais dolorosas da minha vida. E tenho pena e talvez seja por isso que eu suporte todas as suas agulhas e facas e canivetes previamente colocados em lugares estratégicos. Suportar quando você machuca lhe dá suporte para sobreviver. Mas, você não é vivo já faz tanto tempo. Sim, eu choro e choro e choro esse chorinho imbecíl - meu escape natural para não magoar tanto - porque sou de carne e osso. Eu odeio você com todo amor do mundo. Você sintetiza o funesto, você anuncia o funesto, tem o odor do funesto. E se você o trouxer, a culpa será de todos nós? Eu não suporto, minha mente não suporta, meu corpo não suporta mais sentir culpa por você. Não estrague o resto dessa droga toda. E enquanto isso você pensa que é o melhor com essa sobrevida miseravelsinha. Tudo bem, apanhe todo o seu glamour, inteligência, sensatez, bom gosto, decência e deixe-me decair, já não falo por ninguém. Nunca nos abraçamos? Nunca foi abraçado? Você não foi pego no colo? Não caminhamos juntos, a três, no parque de diversões? Nem corremos na chuva? E as bexigas? As fantasias que vinham em pacotes? O que era aquela outra brincadeira apenas sua e dele? Seria melhor se fosse pior? Eu lembro. Recupere o belo, o bom, o agradável. O resto não era para ser assim, eu sei, mas tenho recebido tantos abraços e tenho pena de você quando olha para mim com toda essa superioridade porque podia estar sendo abraçado. Quando choro, não é por fraqueza, mas por desejo de lhe sorrir - e se isso for fraqueza, choro por fraqueza, toda fraqueza do mundo. Por que você insiste em lembrar o que ninguém queria ter vivido. Ninguém queria. Todo mundo sofreu. Então pare de magoar. Deus, você precisa de uma camisa de forças e dormir profundamente e ir para bem longe no seu pensamento. Estou cansada de entender e compreender o que passou com você e deixar acontecer por isso e ficar assim, despedaçada.Pare, pare, pare, mil vezes, não faça mais isso. Eu preciso sair desse mortuário.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Dane-se

Abandonei o querer você e até o desejo de querer, a maior delícia de todos os quereres, porque agora, meu desejo mais profundo e sincero é que você se dane. Talvez isso dure até amanhã, não o desejo insalubre de não querer, mas o desejo de que você vá para o inferno. Também, não há maldade em mim que lhe queira morto e ardendo no fogo eterno, desejo apenas um inferno metafórico de sofrimento. Desejo que você se dane, é isso.
Ou talvez essa falta dure até quando eu não puder mais olhar nos seus olhos cegos com repugnância, olhos que representam o tempo inteiro um certo não querer sem gosto que você chama de paixão. Sua paixão tem menos gosto que a minha ausência, é o que demonstram abestalhados, buscando o que todos sabem e você finge que não. É por isso que eu quero que você se dane com seu tosco sofrimentozinho infantil.
E veja que lhe fiz melhor do que você é, como ator principal de uma tragédia presenciada por Dionísio nenhum. Mas, dane-se, porque não era para ser a catarse da minha vida, apenas uma história bem contada que nem precisava ter final – que dirá final feliz. Só queria uma paixãozinha leve e fresca e divertida porque a vida tem que ser assim, puro riso e não este ato sofrível que você representa.
Não vou ditar a cartilha da vida, ensinar um caminho do novo, mostrar expectativas, esperar que você desperte deste sono inútil. Cansei de você e estou indisponível no momento. Ah! Sim, disponibilíssima para ver você sofrer. Você vai acabar sabendo de mim, sem querer. Mas dai vai ser tarde, vai ter que bater na porta que eu fechei. E sei que não vai bater na minha porta - pois se não é o covarde mais estúpido que já conheci - porque ali estará a placa em letras garrafais com um recado pra você: Vá se danar.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Exilada do seu Reino

Mulher imponente de olhos enigmáticos. Sinto-me quase como Capitu e seus olhos de cigana oblíqua e dissimulada. Sempre quis ter os olhos de ressaca de Capitu, mas olhares não se fabricam... Entretanto lá vêm eles a dizer que meus olhos são misteriosos e que sou majestosa. Eu quando realmente quero olhar como mar bravio que afoga, transformo-me numa água mansa, quase a fechar os olhos... Não sou impiedosa, preciso de piedade.
Sim, alguém iria ignorar-me, mas por que você? Tanta frieza e ausência de gestos com qualquer sentimento que seja. Não consegue ver um quê sequer de beleza em mim que possa ser apreciado? Você reduz meu olhar, desejado por tantos, a uma insignificância. Enquanto espero ansiosamente por sua presença, percebo que sou obrigação aos seus olhos quando me vêem. Você parece respirar fundo por ser obrigado a me olhar. E nem me olha, como se a sedução intrínseca a mim, tão disputada, para você fosse lixo.
Você tem a sua vida e eu gostaria de deixá-lo viver em paz. Mas eu quero tirar a sua paz – e tirar as arestas restantes – dando-lhe paixão. É, paixão mesmo. Estou cansada de inventar palavras para sentimentos. Eu tenho a minha vida também, mas gostaria de deixá-la para viver a sua, estar com você, por alguns instantes ouvir sua grave voz tão baixa e arrastada no meu ouvido. Sei construir momentos inesquecíveis. Será apenas um momento, não se esquive. Não sou exigente, há um mundo que me espera num tempo infinito e sei que posso tanto... Mas quero você, antes de mais nada.
Desejo coisas tolas como roçar meu rosto no seu peito. Peito tocado por outras até então, realizado pelo seu desejo. Mas você me cumprimenta com os dedos, mal aperta minha mão, como se não me conhecesse, ou como se preferisse não me conhecer. Deve estar apaixonado, vivendo um romance, amando desesperadamente outra mulher, enquanto eu espero o que você não quer que eu queira. Ou pior, o que tanto faz... Ah, isso dói, menino, e como.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Pirei em você

Parei na tua, rapazinho. Não deu. Teu sorriso amarrado me seduziu e eu não sei o que faço. Vidrei na tua, irmãozinho. Teu olhar que não me olha me abandona o corpo. Me olha com preguiça, lindo, mas olha. Eu tô louca porque é só na tua boca que eu penso, é só ela que eu quero - eu até olho pra outras tentando desejar. Que é que há nessa boca, me deixa saber, moleque? Faz assim, não. Tu tem um tudo que me aquece e me derruba sem encostar um dedo sequer no meu corpo. Mas me deixa te provar... Por que tu me faz pensar que teu olhar me chama, se a chama é só minha? Brinca assim comigo não. Eu piro só de te olhar... Por que tu não faz o resto? É com loucura mesmo, com toda loucura do mundo, que se dane o mundo. Depois tu vê o que faz, escolhe o que quer, quem quer, fica com todo o resto que te quer, mas antes me beija, me abraça, me faz feliz por um segundo acalmando isso que vibra de olhar pra ti. Depois, depois é depois. Eu nem quero saber. Te quero, e só.

domingo, 8 de maio de 2011

Onde você estava?

Onde ela estava? - fizeram a pergunta. Onde estava sua mãe? – tornaram a perguntar. A princípio doeu só de leve porque lembro de sua presença. Mas, depois de algum tempo perguntei chorando “onde você estava?” Sei que esteve em lugares ocultos, eu não a via enquanto me observava. Esteve também enquanto eu via, quando eu falava, quando não me escondia. Como somos parecidas... Mas, ainda assim, quando no esconderijo, por que não me procurou, onde você estava? Sei que me carregou nos braços, enxugou minhas lágrimas com aquelas mãos do tamanho do meu rosto, penteou meus cabelos tentando deixá-los em ordem, deu-me todos os xaropes necessários. E fica a dúvida de onde estava você enquanto meu coração se partia. Sei que esteve no quarto ao lado, e penso que vez por outra olhou pela brecha da porta. Mas, onde você estava? Que espécie de lentes eram aquelas que você usou e por isso não me viu tão bem? E por que as deixou num lugar tão baixo, ao alcance das crianças, onde eu as pudesse encontrar e usá-las, imitando sua atitude adulta. Passei a ver com seus olhos. E já não vi você nem mais nada. E não sabia mais onde eu estava. Não sei onde você estava, apenas sinto uma falta tão poderosa de anos a fio que ainda me fazem chorar, mesmo sabendo hoje onde encontrar você. Só não sei procurar, buscar, pedir que fique, tudo porque não vi onde você estava.
Pare com isso de culpa porque eu já não a busco. Sou consciente das limitações e acabei descobrindo que você estava em si, no meio de suas muitas dores. Como somos parecidas... E vejo-me agora, culpando-me, chorando, por saber onde você está e não saber amparar quando posso ou quando devo, ou simplesmente não querer ao menos olhar, perdida num não querer de raiva, solidão e paralisia inútil. Eu amo você e a cravei com pregos rústicos em meu peito consertado por minhas próprias mãos, jamais a perderei. Queria que você tivesse feito o conserto por mim, neste peito de costuras sem arremates, de remendos, materiais diversos e substâncias que estancam o sangue. Penso que seriam menos marcas ou cicatrizes, menos danos depois de tantas perdas. Mas talvez se o fizesse, esquecesse de colocar a si mesma no meu coração. Talvez seja essa a razão de eu ter sofrido tanto, ter você dentro de mim. Onde você estava, não importa? Que vou procurar no passado? Mesmo que já não esteja, estará pregada em mim, é o que faz o desespero, mais do que o amor. Eu a amo desesperadamente.

sábado, 7 de maio de 2011

Se digo que não quero é porque quero

Loucura pensar em você neste minuto e no próximo, ou mesmo daqui a pouquinho. Mas penso, e ao mesmo tempo sinto um prazer inexorável. E quando penso em não pensar já estou pensando, pois assim deveria ser com o não segurar a sua mão no tempo de uma breve em Adagio, assim deveria ser com o não abraçar você embrulhada no seu moletom e sendo a sua segunda pele, assim deveria ser com o beijo que não vai acontecer... As negativas deveriam ser sonhos, os desejos, pelo menos possibilidades. Os meus quereres conscientes de não pertencerem a você deveriam ser transportados para o seu coração, através dos nossos olhares, ainda que fossem aos pedaços. Pequenos pedaços estilhaçados e quase irreconhecíveis, mas eu estaria em você.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Porta na cara

Odeio bancar a imbecil quando me importo, colho as flores que plantei, parto para entrega-las e sou recebida com uma pancada da porta na cara. Certo, não posso obrigar ninguém a se importar porque me importo e talvez essa sentimentalidade toda não convença. Mas receber flores não machuca, então receba, ainda que seja para joga-las fora. Não quero entrar para tomar um chá, não quero dividir, quero doar apenas. Ser amável e ir embora. Triste é não receberem as flores por pensarem que quero algo em troca. Porta na cara, buquê na mão, sentindo-me uma idiota. Abandono as flores e levo a sensação da preferência da agressividade e do fazer sofrer enquanto se sofre. Tolice querer distribuir flores. Tolice pensar que se pode levar segundos de alívio com o cheiro e as cores dos tolos lírios, das bobas violetas, das orquídeas abestalhadas.

Bagunça

Alguma coisa em você bagunçou algo aqui dentro. Mas, eu não quero que você saiba. É claro que um pouco disso é o medo da rejeição. Mas outro pouco quer simplesmente se apaixonar num esconderijo, num quarto escuro que me impeça de expor minha pele a um sentimento e impor a minha carne uma busca insana. Então, não quero saber se é verdade o susto que leva meu coração pulsando tão agitado quando se depara com você, e nem se é esse pulsar que impede a profundidade honesta do meu olhar nos seus olhos. Nem de você quero saber, da sua história, do que lhe vai por dentro, e vou tentar evitar o que lhe cerca.  Mas esse tumulto interior pede que ao menos eu sinta silenciosamente esse pandemônio todo que grita seu nome, ainda que eu não sinta você além do meu sentido perturbado. E se meu esconderijo for inútil e você perceba o meu sentido e se ria e se inflame de orgulho de si, visto minha máscara de "não me importo" ou a outra de "isso não é comigo". E enquanto meu coração desarranja, vamos nos cruzando para que eu me esvazie de expectativas, esperanças e vislumbres. E ao mesmo tempo, me preencha de um não querer tantas coisas por pura falta de opção. E por desejo, porque mais do que intuitivamente, sei o nome dessa bagunça toda: DESEJO.

domingo, 1 de maio de 2011

(in) consequencias

Sou uma daquelas pessoas que se casaria numa igrejinha na beira da estrada...
Com alguém que conheci na beira da estrada...
Que diria não no altar...
Que pediria divórcio no dia seguinte...
Que sumiria na mesma semana...
Que viveria feliz num flet, amando quem me amasse, dividindo o pote de sorvete e brigando por causa do cachorro...
Capaz de amar agora e odiar no próximo segundo...
Capaz de perdoar a pior traição para não ficar só...
Capaz de recordar o erro mais tolo pra me livrar de alguém...
Sempre convicta de meus sentimentos e sempre duvidando da sombra de meus atos, se são frutos da minha impulsividade e intensidade...
Dificilmente paro pra pensar. Eu penso enquanto corro com pressa não sei do que e com medo de chegar onde quero.